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Nesse dia a previsão mostrava vento de S / SO de 20 a 30 km/h com picos de 50 km/h no tecto a 3400 m por volta das 16:00 horas, com boa térmica e boas nuvens. A tarefa para o dia, bastante optimista “to say the least”, era de 261km, para um aeródromo na base dos Pirinéus, Santa Cilia. A perspectiva era de que ninguém conseguisse chegar mas, como a previsão para os dois dias seguintes de "Vuelta" era merdosa excepto nos Pirinéus, teríamos de ir para lá e seria melhor irmos a voar até onde pudéssemos. Eu estava estoirado, doíam-me as costas de 4 dias de voo seguidos com 4 horas no ar no dia anterior, não gosto de voar com vento e por isso não estava com grande pica. O Paul Harvey também não e combinámos ser dos últimos a descolar, tentarmos voar juntos e aterrar cedo, de preferência juntos. Afinal a descolagem não estava terrível e vimos quase todos descolarem e ninguém aterrar para reflight. Havia algumas nuvens. O Paul descolou e a seguir a ele, antes da Tina e do Carlos Puñet, que fazia de chefe de pista e que era quase sempre o último a descolar, seria eu. O Carlos veio pedir-me que deixasse a Tina sair antes de mim, ao que acedi (...). Eu iria ser rebocado pelo Miguel, no trike, e pedi-lhe que me largasse numa térmica e que me dissesse quando me largar. Lá fui. Pensava que o Miguel me ia pôr a sotavento do aeródromo, debaixo de uma nuvem boa que tinha levado quase todos os outros pilotos. Qual quê! O safardola põe-se a ir para Norte, para uma zona onde só havia sombra, ninguém a voar, nada... Andou, andou sempre a direito, para longe do aeródromo – 7 km! –, numa rota que não levava a lado nenhum... Às tantas, farto, resolvi largar-me, a 700 m AGL. Nos 10 minutos seguintes, em que não me lembro de alguma vez ter chamado tantos nomes a alguém em nenhuma ocasião como nessa, ao c*** do filho da p*** do Miguel, perdi 400 m e fiquei a 300 AGL, sempre na sombra. Às tantas vi um grande abutre passar 20 m abaixo de mim e resolvi segui-lo para SE até o ver a subir... e eu a subir, devagar, logo a seguir. Meia dúzia de voltas a 1 m/s, recentrei a ascendente e – ufa! – topei com um núcleo de 3+ até aos 1900 (900 AGL) que me permitiu esquecer-me – momentaneamente, claro – do c*** do filho da p*** do Miguel e passar a considerar que provavelmente o dia me daria mais hipótese do que merrecar miseravelmente a meia dúzia de quilómetros do aeródromo. Nos quilómetros seguintes, apontado a NE com o vento e com as nuvens a marcar, subi acima de 3000 e após uma hora de voo estava a 40 km da descolagem. Como de costume, absolutamente sozinho...

Na hora seguinte, sempre acima dos 2500 m, apanhei mais 4 térmicas e fiz 75 km, uma média que não tinha conseguido fazer nem no ventão do Nordeste do Brasil. Apesar de levar duas luvas em cada mão, de cada vez que chegava ao cimo de uma térmica, por volta dos 3500, estava geladinho e desejando descer. A Oeste de Sória e a 3800 o panorama mudou: o Carlos tinha-nos avisado de que havia uma cordilheira fechando o vale por onde estaríamos voando em que haveria poucas aterragens e onde deveríamos chegar ao tecto porque a seguir a essa fase, no vale do Ebro, a condição era caracteristicamente muito estável durante algumas dezenas de quilómetros pelo que, se não estivéssemos suficientemente altos, não conseguiríamos provavelmente ultrapassá-la. Cheguei ao início desta cordilheira com 2000 m, 1000 AGL, e de facto não abundavam as aterragens. Apanhei uma boa até aos 3000 e apontei a uns cúmulos bem escurinhos 10 km mais à frente que me subiram aos 3600, altura com que me apresentei ao famigerado e estável vale do Ebro, onde o vento passou de SO franco para ESE fraco. Lá fui, a direito, apontado a NE durante 45 minutos em que fiz 60km sempre a descer, felizmente devagar. A partir de meio dessa distância, vendo o vento nas eólicas vir da direita e tendo sido avisado de que os campos que, ao longo desse vale, pareciam bons para aterrar tinham quase todos aspersores, fui pensando “vou aterrar naquele”, “não, vou aterrar no outro”, “não, vou aterrar naquele mais para lá”... Com isto já levava quase 200 km e sabia que iria aterrar antes dessa marca, mas tinha a desculpa de que o dia anterior, com o seu voo de 170 km em 4 horas, tinha sido muito cansativo e que o voo deste dia teria sido só para fazer um par de horas e aterrar, nunca para chegar ao golo que, ainda para mais, tinha sido declarado impossível por todos excepto pelo Christian. Ao chegar a menos de 1000 m AGL, numa zona aterrável, um tractor que trabalhava num campo perto mostrou-me que o vento estava agora de S e outro passaruco mostrou-me onde se subia, o que fiz, com pouca deriva, até aos 2000 m. Voei para E, na direcção do golo e ao longo de uma cordilheira que pensei que não conseguiria ultrapassar até que, a 500 m AGL e já a escolher onde aterrar, vi um fenómeno que nunca tinha visto: um “remoinho de trigo”, em que o trigo numa seara rodava, impelido pelo vento de um “trigo devil”, permitindo ver exactamente de onde e para onde se movia, no chão, o centro da térmica. Calculei a deriva e pus-me em cima e, como planeado, lá enrolei a 2-3 m/s até aos 1800 m, altura que me permitiu saltar a cordilheira para N. Nesta altura eram 18:30 da tarde, já tinha mais de 200 km, ainda subi até aos 2000 m ao passar a corda e só tinha, nesse vale, dois campos para aterrar. Cheguei ao primeiro ainda alto e teria sido um desperdício (de altura) ficar por ali. Ao dirigir-me para o segundo vi que estava a meia distância entre ele e a cordilheira seguinte, que me daria mais meia dúzia de quilómetros em relação ao golo. “Um  dia não são dias, que se f***, vou para o vale seguinte” que parecia ter uma ou duas aterragens menores. Ainda ensaiei uma volta 50 m acima do cume da cordilheira para ver se havia alguma ascendência e, como não havia, não tive então outra hipótese que não mergulhar para o buraco e apontar à tal “meia aterragem” que tinha visto. Fiz ésses curtos com os aerofreios accionados para perder 200 m, apontei ao mini-campo num buraco circundado por taludes irregulares e arborizados, com um speed do caraças no buraco sem vento apesar de estar apontado a S, afinal o campo tinha cereal, empurro tudo e acabo com uma narigada – a primeira nesta asa – pouco violenta mas algo aparatosa, testemunhada pelos condutores de dois carros com logotipos que estavam parados na estrada nacional que bordejava o campo escolhido. “Estás bién?”. Estava: “si, estoy, pueden ayudarme con el ala?”. Também que sim. E lá vieram os dois “guardias de la naturaleza” ajudar-me a levar a asa para perto da estrada enquanto eu, ofegante do esforço, me desculpava repetidamente por ter pisoteado “la campa sembrada”. Dizia-me um deles que antes até achava graça à asa delta mas que, depois de me ver aterrar, tinha constatado que detestava este desporto... Foram-se embora, liguei à minha Queridinha que estava a 20 minutos dali, mandei uma mensagem à organização dizendo que tinha aterrado bem. Fiz 233 km em 4:30 horas e fiquei a 28 km do golo, onde só chegou o Christian; melhor que eu fizeram também o Carlos Puñet, que ficou a 15 km, e o Alberto, apenas 3 km à minha frente, a 25 km. Nada mau...

PortugalRicardo Marques da Costa @ 2024-06-25 19:03:35 GMT Linguagem Traduzir   
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